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15 de junho 2014

O ponto de vista de Silvestro Montanaro (jornalista, escritor, autor de televisão e documentarista investigativo italiano) sobre os ataques de uma parte da "esquerda" italiana contra quem apoia os movimentos sociais que criticam a realizaçao dos mega eventos no Brasil.

Silvestro Monanaro

Duas palavras sobre a Copa do Mundo no Brasil

por Silvestro Monanaro*

 

Publicado no dia 9 de junho 2014 na pagina Facebook do autor e aqui nesse site

Tradução Gizele Alvez e Carlinho Utopia

Anos atrás, Roberto Murolo e Lina Sastri interpretaram uma extraordinária melodia., "Quante bugie" (Quantas mentiras). Era dedicada a cidade deles, Nápoles... e convidava a ir alem das aparencias para descobrir, com seus eternos males e vielas, a dor profunda que absorve a história cotidiana.

 

Em síntese, diziam, se vocês querem conhecer Nápoles, caminhem pelo seus bairros de periferia. Ali, vocês irão ver quantas mentiras que são ditas... e que o sol, o mar e a alegria são uma parte da alma e da vida das pessoas que ali vivem... o resto, há um sabor imensamente amargo.


Nestes últimos dias, antes do inicio da Copa do Mundo no Brasil, explode a polemica. Eu esperava que as inteligências acordassem e finalmente fizessem as contas com este sempre mais monstruoso "coliseu", que são os eventos organizados pela Fifa. Nada contra o futebol, pelo amor de Deus! Mas, quanto futebol restou em meio a este "business" bilionário que ainda leva o seu nome?

disegno di Ivan Navarro Sardella

E mais... nada contra os grandes eventos internacionais, mas como não ver que alguns grandes fluxos de gastos públicos, quero dizer, dinheiro dos contribuintes, venham sendo investidos em eventos como a Copa do Mundo, em países com alarmante desigualdade social e podres injustiças... sem nem pensar por um segundo, como possível instrumento de requalificação urbana e social? E como não ver que, no final, aquele dinheirinho NOSSO oferece vantagens somente para uma bem conhecida minoria.

 

Agora, um circulo crescente de "servos do poder", acusa quase de racismo quem critica a faraônica, cara , violenta e corrupta operação da Copa do Brasil. "Porque vocês criticam?" Diz esta suja companhia. Talvez, o Brasil, estando no Sul do mundo, não há direitos a organizar estes tipos de eventos?

E acrescentam que eventuais roubos e faltas, no fundo, sempre existiram e irão sempre existir, em qualquer latitude. Resumindo... Viva a Copa e Viva o Brasil! O país mais bonito do mundo, e escutem, escutem... o mais socialista graças ao governo de Lula antes e agora de Dilma... Pobres mentirosos...

 

Ninguém põe em duvida o direito do Brasil de organizar um grande evento, é agora a 8° economia do mundo, e até nos ultrapassou. Mas são os brasileiros que dizem. A critica de massa, expressada nestes meses em milhares de manifestações,  a um investimento que rende proveito para poucos e não altera, pelo contrário, agrava os problemas de sempre. Escolas, hospitais, direitos elementares são, e restarão para poucos.

 

Os milhões investidos poderiam requalificar ambientes urbanos terríveis, em vez disso, produziu outras violentas marginalizações. E é óbvio para qualquer um que seja de boa fé, que um ingresso para assistir a um jogo, igual ou maior do salário mínimo de um brasileiro, soe mais que uma ofensa, por tanta gente daquela parte do mundo.

 

O país mais "socialista" do mundo, com Lula e Dilma, há certamente aumentado salários e pensões, mas ao mesmo tempo, não quis controlar um excessivo aumento dos preços que aqueles aumentos tinham anulados. Preços que, com a copa, agora estão nas estrelas. Aquele mesmo país mais "socialista" do mundo, com Lula e Dilma, se é definitivamente entregue aos senhores dos "grandes negócios"

 

O desenvolvimento é baseado também em um aumento de consumos, digamos, muito "estimulante". Não um aumento real da capacidade de gastar dos cidadãos, mas instrumentos financieiros, como as compras com cartão de débito, que aumentaram até entre as famílias mais frágeis economicamente (que ainda são maioria) de inúteis cartões magnetizados. Em média, cada família possui uma dezena, e todos viraram cartões de crédito, devido os interesses financeiros, que no Brasil "socialista", chegam e superam tranquilamente o 100%. Um mar imenso de débitos, chega em tantas partes das famílias brasileiras. Dívidas que devem ser pagas, mas não se sabe com qual dinheiro. 

 

E sempre neste "paraíso terrestre", a finança tem em mãos as alavancas dos poderes que possuem a gestão da saúde e da escola. Obviamente, aquelas particulares, a caro preço. Adivinhem quem se opõe as propostas de melhoramento daquelas escolas e hospitais públicos, reduzidos em condições miseráveis?

 

Quem sabe o porque me vem em mente que entre alguns de nós, estariam louvando a um parecido sistema politico, que com certeza existe, que é a do "Nós também temos um banco!". (ndt. conversa telefônica interceptada no ano 2005 entre o líder de "esquerda" Piero Fassino e o presidente da companhia de seguros Unipol, Giovanni Consorte, que esperava tomar o controle do Banco Nazionale del Lavoro. No diálogo, Fassino confessava a Consorte: "Agora nós também temos um banco!")

 

Neste extraordinário santuário do progresso, onde quem contesta, seja um pobre coitado, seja um professor de escola publica, ou um medico de um hospital em calamidade, um gari em greve do Rio de Janeiro ou um trabalhador metroviário de São Paulo... vira um criminoso ou, em todos os casos, suspeito de querer um retorno da direita ao poder ... "Cala a boca! O inimigo pode te escutar!"  Parece mais fascismo, estalinismo... não?  Quem critica esta Copa é um criminoso, um inimigo do país. É como inimigo vem sendo tratado. A critica é inimiga.

 

Linguagem Socialista? Vai embora! É gravíssimo, principalmente em um país que nunca fez as contas com o seu passado ditatorial, e que possui os seus instrumentos de ordem interna (policia, exércitos, forças especiais) ainda impregnados daquela violência e espírito de morte... tanto de não ser ainda capaz de resolver os problemas dos "esquadrões da morte" e da "higienizaçao social" dos pobres, dos negros, dos favelados e perifericos, dos moradores de rua, mesmo estes sendo crianças.

 

Por isso tudo eu peço, pra quem irá daquelas partes, para falar com as pessoa normais e visitar qualquer bairro de periferia. Para entender, para descobrir que o carnaval, a bola, o mar e o amor preenchem também aqui, o teatro das "mil canções ", infelizmente, profundamente mentirosas.

 

O carnaval, como a copa, dura poucos dias... depois, tem a vida, aquela verdadeira... com todo o trabalho e seus problemas. Aquela, que a certos mentirosos de profissão, nunca interessou.
 

 

*Silvestro Montanaro, é jornalista, escritor, autor de televisão e documentarista investigativo.

A sua serie de documentarios pela televisão publica italiana Rai3, "C'era una  volta..." (Era uma vez), por mais de dez anos (desde 1999 até o 2013) foi o programa de documentários e reportagens, único no panorama televisivo italiano, que conseguiu manter aberta uma janela de informação de qualidade sobre os mais obscuros processos de globalização, sobre direitos humanos no mundo, sobre crises e conflitos ignorados intencionalmente.

 

O site "I grandi reportages di Silvestro Montanaro" contem muitos dos seus documentarios.

 

Aqui em baixo o documentario "Thomas Sankara... e naquele dia mataram a felicidade", reportagem do 2013, legendado em português.

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